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segunda-feira, 20 de junho de 2011

Vende-se um doutor por uma moradora de rua de um professor que vem no troco



Vende-se um doutor por uma moradora de rua de um professor que vem no troco

Ricardo Guarnieri

        Essa é somente mais uma história entre tantas que o homem racional e civilizado tem contado e se convencido da sua atuação emancipadora diante dos pobres e oprimidos em busca de uma ascensão quase que mística de uma realidade na qual apenas os merecedores e empenhados serão capazes de tal façanha na sociedade do conhecimento.
        Mais uma doutora entre nós:
        __ Acabei de terminar o meu segundo doutorado, ainda que neste país cada um deles seja trocado por dois especialistas.
        __ E como é esse programa do qual você participou?
        __ Um pouco petista... Professor do estado é tratado como um rei...
__ (Puxa vida, pelo menos...) Pensei...
__ Mas enfim, (disse ela) qual o seu projeto?
__ Pois é, preciso fazer uma pesquisa em que o meu tema tenha a ver com a sala de aula, pois pro estado, o conhecimento ainda está engavetado e...
__ Concordo plenamente, afinal ele está pagando, por isso deve ter o retorno do investimento na sala de aula.
__ (Preferi não dizer a minha opinião...)
__ Mas e aí, o que será então?
__ Penso que o sistema capitalista é nutrido pela sociedade como um todo, e tentarei mostrar que o professor em sua atuação é um desses agentes, principalmente na sua voz do momento “currículo oculto”, ou seja,...
__ Professor deixe disso, o capitalismo agora está fora de moda, isso não existe mais, direita ou esquerda, agora é tudo globalização, veja, até mesmo a Rússia sucumbiu, e a China, você não está vendo? Capitalismo caiu de moda.
__ (Não sabia que o capitalismo era uma opção, uma escolha, vou agora mesmo tirar minha roupa e vestir outra mais confortável. Daqui por diante chega de acordar cedo e trabalhar cinco dias por semana. Eu sabia que o problema era comigo, por isso não vou mais sofrer, contas, que nada, isso é psicológico, enfim, exploração nunca mais, luta de classes é coisa de opressor e oprimido e eu não tenho nada a ver com isso, afinal estou fora deste sistema. Sistema nem existe, isso é coisa que colocam na cabeça da gente) Foi só um pensamento sonhador...
__ Quem vai financiar um projeto furado desses?
__ Silêncio...
Tentei mudar o rumo da conversa:
__ Sabe, existe um mal estar entre os professores, penso que isso merece uma atenção. (Insisti, quem sabe uma psicóloga, leitora de Freud “Mal estar da civilização”, enfim..???)
__ Mal estar? Isso não é nada, eu trabalho com orientação pedagógica, não posso me meter, até porque senão eles me fechariam as portas. Mas sabe de uma coisa, eu vejo todos os dias, a maioria dos professores não quer trabalhar, são incompetentes, não ensinam nada, é pura vagabundice e incompetência.
__ (Ou seja, é apenas uma opção dos professores sofrer? Entendi, não existe sistema capitalista, logo somos os imbecis da vez mesmo e por isso merecemos a punição.)


...
Num outro dia li um texto de um grande filósofo contemporâneo no Blog Crítica Social sobre a farsa da academia, aonde ele diz o seguinte:       
Mas, ao longo do século XX, a ideia de uma universidade autônoma e emancipada, capaz de refletir criticamente os destinos sociais foi, progressivamente, superada pelo pragmatismo da ciência a serviçal do processo capitalista. E não haveria outro caminho, uma vez que a ciência só foi capaz de expandir suas fronteiras por conta da expansão calculada do valor. A mercadoria pagou à ciência-mercadoria a sua qualificação histórica. (Atanásio Mykonios)

        O que dizer diante dessa afirmação? Que talvez um segundo doutorado faça mal a saúde intelectual? Será que a globalização deixou de ser uma dimensão do capitalismo para se transformar num sistema fechado em si mesmo? Ou então, o que será que se tem estudado nesses doutorados da vida? O que esses doutorandos têm lido e provado?
        Ainda não sei, mas essa mercadorização e absolutização e consequentemente naturalização do capitalismo tem me assustado e me afastado dos acadêmicos. Não sei porque, os poetas fingidores me deixam mais inflamados que estes tesetubes provam com suas conjecturas pragmatistas e vendáveis nos balcões das  feiras de exploração e opressão dos iludidos crentes dos viveiros sociais que nos circundam.


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        A última da protuberância         intelectual.
        Um sujeito que se denomina Professor Germano, repórter dos bairros na cidade de Guarapari (Youtube), fazia uma reportagem sobre uma praça publica e o seu descaso quanto a limpeza por parte dos órgãos públicos.
        Ele bradava pelos quatro cantos sobre a inépcia da prefeitura, até que encontra uma senhora sentada num dos bancos da praça. Logo a intitula apresenta-a como moradora de rua e faz uma pergunta qualquer sobre o tema da sua reportagem, quando para nossa grata surpresa ela responde assim: “Eu sou policia militar federal civil portadora do CPF CNPJ estrangeiro de Hong Kong Hiroshima...”  (Que foda é essa?).
        Sabe o que o professor jornalista fez? Largou-a falando sozinha num puro sinal de desrespeito a sua entrevistada.
        Não sei por que, mas acho que ele não entendeu absolutamente nada, não que eu tenha entendido, mas nem um direito a réplica (lembrei na hora da Estamira). E depois ele quer que a prefeitura limpe a praça?

 ...
        Em nome dos doutorandos desse país, da academia farsante, e do jornalista puritano, quero deixar apenas um retardo como manifesto da minha inútil opinião.
        ... o tempo não para, e isso é uma verdade incontestável, mas o século XXI é o campeão das mudanças, tudo resolveu mudar ainda mais veloz. O barato de agora, foi o desejo de ontem, que amanhã será irrelevante, mas mesmo assim algumas vozes tem nos falado nos mais variados cantos e inesperados becos da viola, de uma vida que passa rápido demais por não priorizarmos o jaz do efêmero. E nessa roda gigante que não para por um segundo tem apenas uma saída para o nosso espírito do tempo, mas que acostumamos e inculcamos todos numa embriagues burguesa de um projeto latente em cada poro do nosso respirar. E num momento, numa fração de milésimos talvez se inspirarmos com todos os nossos todos sentidos para alem dos mils, capturaremos e saltamos num tempo sem tempo no qual o maior de todos os gozos não tem duração mais do que o simples gozo sente...
        ...
        Crer para viver...