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quarta-feira, 25 de maio de 2011

Será que a Amanda Gurgel gosta de frango à passarinho?


Será que a Amanda Gurgel gosta de frango à passarinho?
Ricardo Guarnieri


O conhecimento realmente não tem lugar pra acontecer, normalmente se dá na sala de aula, ao menos deveria, o que nem sempre se confirma, mas a questão é que esse tal conhecimento não tem hora nem tão pouco lugar pra acontecer. E isso é muito bom que assim seja, como diz Guimarães Rosa, “mestre não é quem ensina, mas quem, de repente, aprende”, pois é senhores dos rankings educacionais.
Mas voltando e continuando e entrelaçando. Outro dia tive um almoço se não muito gostoso ao menos divertido, por isso resolvi transcrevê-lo. Tentarei ser o mais fiel que puder.
Era um restaurante por kilo. Estava eu na fila e logo ouvi uma conversa entre duas adolescentes que me chamou atenção pelo seu conteúdo. Estavam tomando a lição uma da outra enquanto faziam seus pratos (Como saborear a cor, textura, cheiro, sentidos, enfim, gozar pelo sabor se temos um vestibular que nos espera?).
O diálogo era o seguinte:
Menina 1-
__ A exportação ajuda no crescimento do país e em contrapartida aumenta o superávit primário, enquanto que a importação demasiada pode desquilibrar a balança comercial e gerar desempregos internamente.
Menina 2-
__ Mas não é a importação que facilita o acesso das pessoas a produtos que não temos produzidos no país?
Menina 1-
__ Pode ser, mas não é isso que interessa, pois  o professor disse para nos concentrarmos nas exportações e seus efeitos para o Brasil, pois é isso que vai cair logo mais na prova.
Nesse momento não me aguentei e me intrometi na conversa e perguntei.
__ Vocês provavelmente farão uma prova logo mais, não é mesmo?
Assustadas pelo estranho que apareceu cruzando a conversa elas responderam em coro.
__ Sim, vamos, temos uma prova de história hoje a tarde.
Então prossegui e perguntei...
__ Posso fazer uma pergunta? (e antes que negassem ou não já fui logo perguntando).
Uma delas estava pegando frango a passarinho, aproveitei a deixa e questionei.
__ Qual a relação desse frango frito que vocês vão comer com o tema da prova?
Sem titubear elas responderam novamente em coro.
__ Nada né. (Com uma carinha do tipo, esse cara tá louco) pelo menos foi o que senti com aquele nada tão enfático, e olha que pelo uniforme que elas estavam usando, aquela é considerada a melhor escola de Mogi, o que dirá de nós pobres servidores do pastelão apresentado pela Amanda Gurgel.



Eu entendo. Exportação, importação, balança comercial, superávit primário, frango frito, exploração, injustiça social, trabalho, lucro, câncer, enfim, são assuntos totalmente desconexos, afinal isso de nada interessa para a industria do vestibular.
Eu não me contive com o nada cabal, olhei pra elas e respondi.
__ Puxa vida! Que pena né, vocês são tão jovens, com tanta energia e a escola roubam seus melhores tempos com tanta inutilidade e sofrimento.
Sem que elas pudessem me responder e a fila do kilo não parasse segui rumo a minha mesa, e por incrível que pareça naquele salão tão grande elas se sentaram numa mesa ao lado da minha, mas dali já não saiu mais nenhum diálogo, no máximo pensamentos soltos.
...
E logo em seguida esse discurso da nossa belissíma inteligência Amanda Gurgel, mais um professora entre tantas as milhares que temos visto por aí, contudo, trouxe em seus menos de 10 minutos de fala um discurso revelador.
Na verdade tudo que ela falou não é nenhuma novidade pra nós professores que estamos na sala de aula, mas a doçura e a firmeza de suas palavras balançaram o estandarte social. Ela falou de uma maneira que a muito tempo não sentíamos esse entusiamo e esperança. Uma fala simples e forte, comum e libertadora, me faltam palavras pra melhor exprimir toda a sua graça e resistência.
Confesso que uma alegria boa me invandiu e me fez renovar as esperanças que os professores ainda estão vivos, escondidos é o bem da verdade, mas que de repente algumas Fênixs ressurgem  e trazem novos ares para nossos ventos tão mal cheirosos e inertes nesse lamaçal que a educação se apossou.  

Gostei de todo o seu discurso, mas uma coisa me marcou muito, foi quando ela disse alguma coisa como: “...eles (os professores) não associam mais os nomes aos rostos dos alunos...” É verdade, eu vivo isso ano após ano, e meus colegas todos vivem a mesma coisa.
E o que isso tem de mal? Nada, afinal o que importa segundo os pseudos intelectuais jornalistas e economistas da nossa mídia é a qualidade total e os índices de aprendizagens.
Pois é querida Amanda, infelizmente não será dessa vez que seremos ouvidos, e não falo isso como sinal de desesperança e muito menos por pessimismo, ao contrário, como você mesma disse numa outra parte do seu discurso, “responda se os senhores conseguiriam viver com esse salário, claro se os senhores não forem ficar constrangidos”, então querida Amanda, eles não sabem e tão pouco sentem o que é constrangimento, não pegam ônibus, não fazem jornada dupla, quanto menos tripla e não precisam comer merenda, por fim, não precisam dos nossos votos pra se elegerem.
Na verdade, não dependem do voto de ninguém, no máximo que sejamos bonzinhos e os chancelemos na urna de quatro em quatro anos com o aval dos patrocinadores. Desculpe-me senhores eleitores pela falta de autonomia, pois o carro forte me impede que eu chegue próximo de urnas eletrônicas, posso confundi-las com caixas bancários e querer cair na tentação de levá-las pra casa e quando lá chegar abrir e não encontrar nada por se tratar de uma caixa com peso demasiado e conteúdo nulo.          
 Mas eu não desisto nunca, sou brasileiro acima de tudo e impelido pela paixão até mesmo dentro do caixão na falta de algo mais confortável...e que assim seja...
 

domingo, 8 de maio de 2011

Na imensidão do céu azul tem um encontro...




Na imensidão do céu azul tem um encontro...
Ricardo Guarnieri


__ Quem é você?
__ “A vida é tão rara...” (Lenine)
__ O quê?
__ Pois não, o senhor está falando comigo?
__ Claro, afinal quem é você?
__ Quem sou eu?... Bom... essa não é uma resposta muito fácil...
__ ...Senhor, quem é você?
__ É o que estou tentando te dizer, essa não é uma resposta tão fácil, talvez fosse simples, mas...
__ ...Meu senhor, a minha pergunta é extremamente objetiva, quero saber apenas quem é o senhor?
__ Ah, quem sou eu senhor, ficou mais fácil, pensei que o senhor quisesse saber quem era eu?
__ Mas é isso, quem é você?
__ Tá vendo só, o senhor quer saber quem sou eu ou quem sou eu senhor? Por que...
__ ... Já entendi o senhor está tentando tirar um barato da minha cara...
__ Com certeza não senhor, bom certeza mesmo eu não tenho não, mas que não estou tirando o sarro...
__ Chega de filosofismos e me diga de uma vez por todas quem é o senhor?
__ Mas o queres de mim?
__ Como assim, você veio até aqui, então me diga o que  você quer?
__ Mas eu não vim aqui pra você me perguntar quem sou eu, na verdade eu quero apenas um documento.
__ Muito bem, preciso de um documento pra confirmar sua identidade.
__ Minha identidade, como assim? Não preciso de nenhum documento pra provar que eu sou eu, eu sei que eu sou eu, tá certo que o Descartes me deixou confuso certa vez, mas eu sei que estou pensando e por...
__ Meu caro, é simples, o senhor precisa de um documento que comprove que você é você mesmo.
__ Deixe-me ver se eu entendi. O senhor me perguntou quem eu era e eu tentei te explicar da complexidade que esta questão envolvia, daí o senhor me disse apenas pra que eu provasse quem eu sou, pois bem, aqui estou eu.
__ Não senhor, o senhor precisa de um documento provando quem é o senhor.
__ Como assim? Eu sou eu e pronto, quer prova mais cabal do que eu mesmo em carne e osso.
__ A sua prensença não prova nada, o que eu preciso é de um documento que prove que o que o senhor vai nos dizer é verdade.
 __ Deixe me ver se entendi, a minha presença fisica não prova nada, o que você precisa é de uma prova abstrata, ou seja, um pedaço de papel com nadas?
__ É?! Isso mesmo.
__ Puxa, eu pensei que eu fosse eu, mas eu na verdade não sou nada, eu preciso de algo que não existe pra provar que eu existo...Um pedaço de papel é que me dará todo o sentido da existência, o que eu estou dizendo não significa absolutamante nada?  
                                  


__ É isso, então o documento por favor?
__ Aqui está.
__ Esse documento não vale.
__ Como assim não vale? Foi o próprio estado que emitiu.
__ Está vencido.
__ E documento tem data de validade, eu ainda nem morri...
__ Não senhor, são as normas, não aceitamos nenhum documento com mais de 10 anos de existência.
__ Mas como, o senhor não está vendo todas as informações? Tudo bate, me pergunta que eu respondo.
__ A foto tem que ser atualizada.
__ O senhor é que deve estar tirando o sarro da minha cara agora. Como eu vou ter uma foto atualizada, só se eu ficar tirando documento diariamente, ou quem sabe andar com uma maquina portátil pendurada na minha cabeça?
__ Não senhor, mas a foto está desatualizada.
__ É claro, eu tinha 14 anos e me parece que nesse meio tempo alguma coisa mudou. O senhor por exemplo sempre esteve com essa cara que aqui está?
__ Como assim?
__ Metamórfose, sabe?
__ Não me importa, documentos atualizados ou nada feito.
__ Bom, então na verdade eu não posso provar que existo te falando que eu sou eu porque na verdade eu não existo, melhor, o meu corpo não prova nada? Também não adianta eu discursar sobre a minha existência porque nada do que eu falar o senhor ouvirá, e por fim o meu documento não vale nada por que de quando é esta foto, eu já não sou mais eu?
__ É o sistema.
__ Sistema? Que sistema vocês utilizam? É para humanos livres de um mundo livre?
__ Como assim?
__ Na verdade precisaremos refletir sobre o seu papel no mundo, bom, papel não, porque este pode esta muito desatualizado. É melhor voltarmos a pré história...
“A vida é tão rara...” Quem tem tempo a perder? É na ponta azul que mora os segredos de uma vida em detalhes de felicidades e sentidos guardados a desvendar...